terça-feira, 5 de agosto de 2008

Grameen Bank

O Fim da Pobreza (económica e de mentalidade?...)


Digam o que disserem os mais negativistas, ele há coisas boas a acontecer por aí. Seria bom, se pudéssemos virar o foco para elas.

Uma das coisas mais fantásticas que tem vindo a mudar, para melhor, muitas vidas, chama-se Grameen Bank e é "o primeiro banco do mundo especializado em microcrédito". O Grameen Bank ganhou o Prémio Nobel da Paz do ano 2006 juntamente com seu fundador Muhammad Yunus.

A ideia da criação do Grameen Bank nasceu após o seu fundador, que estudou economia nos EUA, ter percebido, ao voltar ao Bangladesh, o seu país natal, em 1975, que os mais pobres simplesmente não podiam melhorar as suas condições de vida devido ao facto de viverem sob o jugo dos agiotas ou prestamistas, que até então surgiam como única possibilidade de sobrevivência para muitas famílias. Muhammad Yunus percebeu que aquelas pessoas precisavam de uma oportunidade para realizar dinheiro sem serem escravizadas economicamente. A forma de o fazer seria através de um microcrédito que não pedisse garantias, nem cobrasse exorbitantes taxas, condições que, do seu ponto de vista, têm constituído os principais entraves à erradicação da pobreza extrema nos países do hemisfério sul.

A este propósito diz Muhammad Yunus numa entrevista dada à revista "Courrier Internacional" de 2008/06: "Critico o dogma segundo o qual não podem ser atribuídos empréstimos sem garantia, sobretudo aos mais pobres. (...) Os princípios actuais do sistema bancário impedem que metade da população mundial participe na vida económica. Não apenas nos países dos sul mas também nos EUA e na Europa. Os bancos tradicionais exigem às pessoas que sejam solventes, antes de lhes emprestarem dinheiro. Mas para que servem, se não ajudam as pessoas a sair de uma situação difícil, a criar valor e trabalho." E acrescenta ainda que: "Segundo um inquérito recente, 64% daqueles a quem concedemos empréstimos por cinco anos, saíram da pobreza crónica."

Este microcrédito favorece as chamadas actividades "informais", ou seja, a manufactura e venda de artigos diversos, as pequenas reparações, em suma os pequenos negócios familiares. Isto porque, segundo Muhammad Yunus "não promover nada para além do regime assalariado parece-me terrivelmente limitado. Ver apenas o homem como um ser que procura um ordenado parece-me uma concepção muito limitada do ser humano. É uma forma de escravidão.(...) Levamos vidas rígidas, repetindo diariamente os mesmos ritmos de trabalho. Corremos para o trabalho, corremos de volta para casa. Esta vida robótica não me parece um progresso. (...) O homem é considerado apenas como um agente económico, um empregado, uma assalariado, uma máquina. É uma visão unidimensional do humano. Ser assalariado deveria ser uma opção entre várias."

A isto chamo eu um verdadeiro pensador e que, mais do que pensar, age no tecido económico-social implementando as suas ideias.


A prova do sucesso do Grameen Bank, é que já distribuiu 6 mil milhões de dólares a 150 milhões de famílias, sem exigir garantias e com uma taxa de reembolso de 95%.

Que tal aproveitar ideias como estas para fazer face à crise que se vive actualmente no ocidente?

Que tal deixarmos de ver o ser humano como uma mera peça de uma engrenagem que o subjuga continuadamente, e devolvê-lo a si próprio?

3 comentários:

alf disse...

Muito bom post!

Sabes, isto tem de começar no ensino. O ensino tem de formar pessoas para a autonomia, mas não forma, o ensino só forma pessoas para serem empregados - o ensino publico para serem funcionários públicos e o particular para serem empregados no sector privado.

No ensino público já há cursos de empreendedorismo - mas só para os «maus alunos», aqueles que vão abanonar a escola sem terem a formação que os habilitará a serem «empregados».

Nos paises muito atrasados este tipo de iniciativa funciona porque não há um ensino maciço a transformar as pessoas em empregados, mas aqui em Portugal não tem as mesmas hipóteses de sucesso.

Nos EUA há a preocupação de formar para a autonomia, por isso conseguem altas taxas de empresários.

A verdade é que 99% das pessoas preferem ser empregados e empresários. E isto significa que a sociedade trata pior os empresários que os empregados e que não prepara as pessoas para serem empresários.

Fátima Lopes disse...

Excelente comentário Alf,

É mesmo assim, de facto tudo começa no ensino e na forma como se estrutura uma sociedade desde as suas gerações mais jovens. Mas também é uma questão politica pois há alterações que podem sempre ser introduzidas favorecendo o florescimento de novas formas de participação na vida económica. Mas não me parece que no ocidente exista vontade politica para introduzir mudanças significativas nesse sentido.

João Matos disse...

Meus caros
Permitam-me que os trate assim!
O microcrédito para além de comum em diversos países do chamado 3º mundo, também se pratica em Portugal, embora numa escala infinitamente mais reduzida.
Obviamente que o mérito deve ser atribuído, pela sua capacidade visionária e pelo pioneirismo, ao Dr Yunus.
Mas este comentário radica fundamentalmente na discordância relativa a algumas passagens dos textos produzidos por vós.
O nosso sistema de ensino tem como um dos seus principais objectivos formar cidadãos autónomos. Mas não se confunda cidadania autónoma com empreendedorismo, o que será, iniludivelmente, redutor.
Por outro lado, ao ensino privado (básico e secundário) só acede cerca de 8% da nossa população infanto-juvenil (actualmente, porque no passado o número era inferior) o que, de acordo com a afirmação do Alf teríamos uma (absurda) taxa de 92% da nossa população activa no sector público. Daí pode também decorrer a seguinte questão: quantas “rapariguinhas” e quantos “rapazinhos” dos “shopping’s” (sector privado) frequentaram o ensino particular, vulgo colégios?
De facto, para os «maus alunos» há uns cursos ditos profissionalizantes que mais não visam senão a redução da vergonhosa taxa de insucesso escolar e que de formação de empreendedores nada têm.
Para além disso, o sistema de ensino nos EUA (excluindo o universitário que é um “mundo” à parte) tem muito mais semelhanças relativamente ao nosso, do que diferenças. Em alguns aspectos até estamos francamente melhor, nomeadamente no ecletismo da nossa formação.
A questão é fundamentalmente política, diria ideológica e só colateralmente terá a ver com a massificação do ensino. Repare-se que alguns países do leste europeu com níveis de desenvolvimento socioeconómico inferiores aos nossos, possuem taxas de escolarização universitária (com sucesso) incomparavelmente superiores e que por essa razão, os que recentemente aderiram à União Europeia, já começaram a ultrapassar-nos.
Pink, mas não me parece que a solução seja a irrupção de uma vontade política do ocidente para introduzir mudanças significativas nesse sentido (utilizando expressões suas). O problema é mais complexo, profundo e é, também, global.
Os EUA, actualmente a única superpotência económica (e modelo para a quase totalidade dos governantes dos outros países), não produz nada que o resto do mundo queira para além de cereais transgénicos, alguma tecnologia de ponta e equipamento bélico. Acresce que a economia americana é uma “coisa” virtual a que alguns já designam de falácia. Pouca gente que não vive nos Estados Unidos sabe, por exemplo, que aí é possível, para obtenção de múltiplos financiamentos, hipotecar um bem (casa, propriedade) simultaneamente a diversos bancos. Isto é da mais completa irracionalidade e provavelmente por isto está o mundo todo a pagar. Não nos esqueçamos que a actual crise económica mundial teve origem exactamente no crédito hipotecário dos EUA. E que dizer das subidas do preço do crude que, invariavelmente, estão associadas às variações (manipulações) das reservas (estratégicas) estado-unidenses de petróleo.
Portanto a solução só é possível em ruptura/corte radical (não com mudanças, por mais significativas que ela sejam) com os fundamentos deste modelo de desenvolvimento.
Não tem nada a ver com empregados e empresários. Tem sim a ver com uma sociedade (utópica?) constituída por mulheres e homens estruturalmente diferentes em termos de crenças, aspirações e valores.
O que convenhamos… leva muito tempo a concretizar-se!